A história de Germano Zeferino e a luta pela liberdade em tempos de ditadura

 Nicole Sebastião

O militante que dedicou a sua vida à luta pelo futuro de Portugal e foi preso político durante o Estado Novo

Germano tinha olhos misteriosos, um rosto cansado devido às batalhas que travou, uma referência à sua resistência. Trazia sempre consigo o seu acessório favorito, uma boina, que nunca tirava, bem como a sua bengala, que utilizava para se apoiar. 

Germano Fernandes Zeferino esteve preso na Cadeia do Aljube, em 1956.

A sua presença destacava-se. Onde quer que estivesse, fazia-se ouvir, tinha uma força interior muito grande. Há quem diga que tinha uma personalidade forte, um bocadinho difícil de lidar. “Ele era teimoso, muito teimoso”, palavras de Maria Branquinho, sua sobrinha. Tal como ele, pessoas muito teimosas, persistentes, determinadas e ambiciosas, são necessárias para que grandes mudanças ocorram. E por isso, estava destinado a ser um revolucionário. A sua grande paixão era lutar por um mundo justo e igualitário, sem medo de enfrentar as consequências das suas crenças.

Germano Fernandes Zeferino nasceu a 5 de janeiro de 1928, na própria casa em Estômbar, uma pequena freguesia no concelho de Lagoa, Portugal.  

Era filho de Germano Zeferino e Palmira da Conceição, uma família muito humilde, composta por dez irmãos, em que o mais novo era Zeferino. A sua profissão era a de pedreiro, trabalhava nas construções com o seu irmão Francisco. Foi casado e, em seguida, viúvo de Lucília Rafael, falecida em 1978. Esta união deu origem à sua única filha, Clementina, falecida em 2011.

Uma ferida que não se fecha 

A 3 de Abril de 1956, Germano Fernandes Zeferino era surpreendido pela Polícia de Defesa do Estado (PIDE), sendo preso pelo Posto de Portimão por distribuir propaganda clandestina e informações relevantes sobre o Partido Comunista. Mais tarde, foi transferido para as instalações da PIDE, na Cadeia do Aljube, em Lisboa. Zeferino foi detido por cerca de 5 meses e só teve duas visitas autorizadas de sua irmã. 

Registo Geral de Presos, Livro 12 da DGARQ - Direção Geral de Arquivos.

O seu período na prisão foi “traumático”, assinalado por interrogatórios, espancamentos, privação de sono e tortura da estátua, em que o detido é obrigado a ficar de pé sem se mover por longos períodos de tempo. Também passavam fome e, como se não bastasse, quando lhes era fornecida comida esta não era comestível. “Era sopa cheia de bichos, lagartas, baratas”, conta João Zeferino, amigo de Germano. Apesar de todo o sofrimento diário, manteve-se firme em relação à sua confidência, nunca revelando o que sabia.

Registo Geral de Presos, Livro 12 da DGARQ - Direção Geral de Arquivos.

A vida após prisão

Depois de ter sido libertado, a sua vida tornou-se mais difícil. Ficou profundamente traumatizado e revoltado com a experiência, que deixou marcas imutáveis para o resto da sua vida. No entanto, continuou a lutar pelos seus ideais, ainda com mais garra e determinação. Apoiou sempre as ideias do Partido Comunista, participou ativamente nas Festas do Avante, e manteve uma forte relação com a delegação do Partido Comunista- CDU de Lagoa.

No lar era onde se sentia mais em casa, tinha muitos amigos. Também encontrou pessoas que carregavam as mesmas dores que ele, compartilhavam como se sentiam naquele lugar, foi algo que o confortou. Até aos 91 anos, fazia praticamente tudo sozinho. Tinha uma mota que utilizava, contudo preferia fazer as suas caminhadas e se deslocar para ir almoçar com familiares. 

A sua saúde começou a deteriorar-se com a idade, tanto a física como a mental: o facto de proibirem a entrada de familiares e amigos nos lares, devido à pandemia da Covid-19, deixou-o abalado. Faleceu a 13 de maio de 2021, já bastante debilitado. 

Pelo seu compromisso com a luta pela liberdade de expressão, igualdade e justiça social, a vida de Germano Fernandes Zeferino foi como a de tantos outros portugueses que sofreram censura, opressão e tortura, e que nos deixam uma mensagem de esperança, perseverança e justiça. As suas histórias são lembradas como um símbolo de coragem, resiliência, e do que não queremos que se repita.

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