“E eu sempre soube que a minha casa era Portugal”

Maria José, nascida e criada em terras alentejanas, deixou Portugal à procura de uma vida melhor. “Era considerada uma das mulheres mais bonitas aqui da terra mas, mais que isso, a Maria sempre foi uma grande mulher, muito avançada para aquela época”, assim nos diz Hermínia Guerreiro, uma das suas grandes companheiras de vida.

Perfil | Lia Revés

Por terras alentejanas…

Nasceu a 1 de janeiro de 1937, em São Sebastião de Gomes Aires, uma aldeia localizada no Alentejo mais conhecida atualmente por apenas Gomes Aires. Filha de mãe costureira e de pai sapateiro, foi criada, entre 5 irmãos e 1 irmã, num lar onde a generosidade e a partilha eram indispensáveis e sempre muito presentes entre a família. 

Completou a 4.ª classe de escolaridade (equivalente ao 9.º ano atualmente) e partiu para Lisboa com apenas 16 anos de idade à procura de trabalho. Tornou-se cozinheira, e o pouco que ganhava enviava para a família. ”Naquela altura o meu pai encontrava-se doente, também foi uma das razões para ela ter vindo para Lisboa trabalhar, conseguir passar o máximo de tempo e ajudar no que fosse preciso”, conta um dos seus irmãos.

A mudança para Paris…

Nos anos 60, “houve muita gente a mudar-se da terra para França, pessoas que nasceram e cresceram connosco, foram em busca de uma vida melhor”, relata Lídia. “Depois, lá, juntávamos grandes grupos, cada um trazia a sua refeição e fazíamos ali um grande banquete, estávamos felizes. Uns falavam que tinham saudades de Portugal, outros falavam que já nem queriam regressar, mas para à Maria, ali não era onde pertencia", conta a amiga de Maria José, que acompanhou a mudança.

Em Paris, Maria José encontrou imediatamente trabalho como porteira. Conta-nos que “aquela altura havia muito”, era um trabalho no qual ocupava muito tempo do dia, mas que acabava por compensar, pois o objetivo era juntar e conseguir regressar a Portugal com uma vida melhor.

“Acho que o que mais lhe marcou na mudança de país foi o facto de existir tanta diversidade cultural. Nós na terra estávamos muito habituados ao comum e, de repente, chegamos a Paris, uma cidade completamente desconhecida, na qual existia todo o tipo de etnias e pessoas todas diferentes, que acabaram por impressionar um pouco”, relata o marido.

Ser mãe tarde…

“Lembro-me de todos os meus irmãos e eu já estarmos casados e com a vida feita, e a Maria continuava a viver a juventude dela. Sempre foi uma mulher muito bonita, com muitos pretendentes, mas ela preferiu sempre a independência e aproveitar a vida, sempre foi uma das suas prioridades do momento”, refere a irmã mais velha. “A minha mãe era uma mulher independente, ela nunca se interessou muito por casamentos, ela gostava de gozar a vida e nesse aspeto, acho que foi uma mulher muito avançada para o seu tempo”, acrescenta a filha, em cujos traços se identifica.

Acabou por encontrar o amor que a levou a casar-se e, em 1974, o ano em que Portugal festejava o fim da ditadura, nasceu a primeira filha. Sendo que já foi mãe com 37 anos, Maria José permaneceu em França até 1984, altura em que decidiu regressar a Portugal.

Portugal era onde pertencia…

Quando Maria José deixou Paris e regressou à terra “estava tudo igual e eu lembro-me de ela estar feliz. Sempre disse que Portugal era a sua terra e é era aqui que queria passar o resto dos dias da sua vida” relata a filha. As poupanças de tantos anos foram investidas numa casa, mesmo ao lado da habitação onde tinha passado a sua infância. Maria José também investiu em terrenos e começou um pequeno negócio. A partir dali, “a vida era mais feliz”.

O amor pelo fado…

Maria José teve sempre uma grande paixão pelo fado, especialmente o de Amália Rodrigues. “Ouvir a Amália era simplesmente viajar para outro mundo à parte, é ficar em lágrimas pela beleza e o sentimento nas palavras cantadas. Eu e os meus irmãos sempre fomos muito apaixonados, e continuamos, depois de muitos anos, a ser”, confessa Maria José.


Comentários