Covid 19: o único cliente que não é bem-vindo nas papelarias algarvias

As papelarias estão entre os poucos estabelecimentos que nunca encerraram durante o confinamento. Ainda assim, no que respeita ao consumo de jornais e revistas, registaram uma diminuição nas suas vendas. O Olhares Académicos foi ao encontro de dois negócios do Algarve ameaçados pela pandemia.

Rita Viegas e David Carvalho

Apesar das dezenas de quilómetros os distanciam, Carlos Lola e o casal Ana Isabel e José Manuel, proprietários de papelarias em Albufeira e Lagos, enfrentam consequências similares de uma pandemia que mudou o mundo. 
Na papelaria de Carlos Lola as vendas sofreram uma quebra expressiva durante os meses de confinamento.

Há 14 anos que Carlos Lola explora uma papelaria no mais central dos centros comercias do Algarve.  O comerciante situa nos 90%, aproximadamente, a quebra das vendas durante os meses de confinamento. A faixa etária dos consumidores de jornais, entre os 60 e 70 anos, os mais frágeis nesta situação pandémica, e a localização da loja numa superfície comercial, onde o acesso nem sempre é o mais fácil, são, a seu ver, factores determinantes. Em Lagos, Ana e José confessam que esperavam um cenário bastante pior para o negócio. Com a loja aberta para a rua, numa zona residencial de fácil acesso, fará diferença o facto de os seus clientes terem em média 60 anos, consumidores que continuam a preferir jornais e revistas em papel. Nas duas cidades, o Expresso, o Correio da Manhã e o Público dominam as vendas. Contudo, os lacobrigenses juntam às suas preferências a Bola e o Record.

A venda de revistas não registou uma diminuição tão acentuada. Em ambas as papelarias, os proprietários declaram que a faixa etária dos consumidores situa-se entre os 25 e 45 anos, o que ajuda a explicar os números anteriores. Nos dois estabelecimentos, a Tv 7 Dias e a Caras são as preferidas dos clientes, divergindo apenas a Nova Gente, na loja de Carlos, e a Sábado e a Visão, em Lagos. Para espanto do empresário de Albufeira, as revistas relacionadas com temas como economia, caso da The Economist, história e cultura, National Geographic, e saúde, Lancet, inverteram a tendência, registando aumentos nas vendas, assim como os passatempos e revistas infantis. 

Em Lagos, as vendas de jornais também diminuíram, mas os proprietários Ana e José têm esperança no verão.

Numa região como o Algarve, que atrai turistas das mais diversas nacionalidades, houve também um impacto negativo no conteúdo não nacional. Por existirem frequentes devoluções dos produtos à VASP, a distribuidora optou pela suspensão do envio de jornais, conta Carlos Lola. No caso concreto das revistas, as entregas continuaram a ser feitas, por ser um produto que registava vendas. A procura pelos jornais estrangeiros deixou, simplesmente, de existir. Jornais como o Daily Mail e Le Monde que, normalmente esgotavam, deixaram de ser adquiridos. Já Ana e José, apesar de também terem sentido a diminuição do público estrangeiro, relatam que esta diminuição não ocorreu no setor da informação, pois na papelaria que gerem nunca foram vendidos conteúdos noutros idiomas senão o português, à exceção da revista ¡Hola!, cujas vendas diminuíram, mas o seu impacto não foi significativo.

Mesmo cumprindo todas as normas de segurança e higiene impostas pela Direção Geral de Saúde, a maioria dos clientes aparenta ter receio em mexer nos produtos que estiveram em contacto com os colaboradores, fazendo com que muitas vezes, pelo medo do contágio, evitem deslocações a espaços públicos.

O trabalho tornou-se solitário. É com alguma emoção que Ana Isabel e José Manuel, em Lagos, e Carlos Lola, em Albufeira, recordam os anos anteriores, quando tudo parecia garantido e estável. Embora perturbados por este ano atípico, que ficará para sempre nas suas memórias, os proprietários consideram-se sortudos porque, contrariamente à maioria dos portugueses, não perderam o seu emprego, nem realizaram despedimentos. O verão que se avizinha é sinónimo de esperança e expectativa de que o funcionamento das papelarias voltará ao “normal”. 

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