Mexeu com uma, mexeu com todas?

Opinião | Catarina Cunha

Marielle Franco, uma mulher que combatia o extermínio da juventude negra, a intolerância religiosa e a fobia LGBT foi assassinada. Mas a verdade é que esta morte simboliza, diria eu, uma tentativa falhada de calar as minorias. Falhada porque não passou despercebida, como passam as centenas de mortes diárias de mulheres vítimas de violência doméstica. “Marielle Presente! Hoje e sempre”, “Mexeu com uma, mexeu com todas!” e “O lugar da mulher é onde ela quiser!” foram algumas das frases mais ouvidas e lidas na última semana.

Mas será mesmo que mexeu com uma, mexeu com todas? Gostava de acreditar que sim, que todas as mulheres se uniram para mostrar que de facto a luta ainda não acabou. Que nenhuma mulher, aliás, nenhuma pessoa, devia ser vítima de violência ou assédio. Porém, por mais que eu tente não encarar a triste realidade em que vivemos, não posso deixar passar em branco comentários vindos de outras pessoas, mais preocupante, vindos de outras mulheres. Isso precisa de mudar. Quando é que uma mulher, só por ser mulher, por mais que ela esteja de fato de treino ou de minissaia, quer ela esteja a sair do ginásio ou da discoteca vai parar de ser abordada por desconhecidos na rua? É necessário existir respeito e perceber que a roupa que alguém usa não define o seu carácter.
Fotografia: Mario Ângelo/ Sigmapress/AE.

Há pouco tempo, numa das viagens que faço diariamente entre a vila onde vivo e a cidade onde estudo, ouvi uma rapariga dizer que se desabotoasse a camisa ia parecer “muito puta”. O pior é que eu já pensei assim, já achei que se usasse um determinado top ia parecer que era muito fácil e não o usei porque o queria evitar. Não temos de ter medo de usar algo que gostamos e queremos. Não podemos deixar de usar determinada roupa ou maquilhagem por ciúmes, nem o devemos fazer por alguém. Não podemos deixar que alguém nos levante a mão, chega de ver a mulher como uma dona de casa e a submissa. Não somos propriedade do outro, somos donas de nós próprias e temos de fazer aquilo que nós queremos e gostamos.

Temos ainda um longo caminho pela frente. Temos de nos unir e mudar as mentalidades porque a realidade das mulheres não prosseguirem os estudos, casarem aos 16 anos e viverem fechadas entre 4 paredes não nos é assim tão distante. Não podemos esquecer nunca a nossa história, temos de continuar a luta começada por muitas mulheres em 1857. É com muita pena minha que chego à conclusão de que mexeu com uma mas afinal não mexeu com todas…

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