Eu voto...

Lígia Oliveira

"Eu achei que vinha pra uma reunião política, mas me enganei, vim pra reunião dos bons maridos, bons pais e dos bons moços. Engraçado que estão todos na lista da Lava Jato. Eu voto não.” A declaração foi feita por Chico Lopes, deputado federal do partido PCdoB, durante reunião no plenário que definiu o andamento do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

Foto: Revista Carta Capital. http://www.cartacapital.com.br/especiais/impeachment
A votação, comandada pelo deputado Eduardo Cunha, do PMDB, aconteceu neste domingo, por volta das 6 horas da tarde na Câmara dos Deputados, em Brasília. A presidenta brasileira foi acusada pelo relator Jovair Arantes, do partido PTB, de crime de reponsabilidade contra a nação, por causa das chamadas “pedaladas fiscais”.

O processo, que faz parte de uma das etapas do procedimento de impeachment, estava sendo conduzido como uma semifinal de Copa do Mundo. Assim como nos estádios de futebol, do lado de fora da Câmara dos Deputados foi construído um muro para separar os manifestantes que divergiam opiniões. De um lado os representantes pró impeachment vestiam verde amarelo e ostentavam bonecos infláveis gigantes e animadores de festa. Do outro lado do muro, os manifestantes contra o impeachment ornavam a cor vermelha - cor do partido de Dilma- e exibiam suas placas escritas “Não vai ter golpe”. O cenário era de apreensão. Todas as emissoras de televisão brasileiras, com exceção do SBT, transmitiam ao vivo a partida, enquanto na Internet podia acompanhar de qualquer parte do mundo por meio do sistema de streaming.

Dentro do plenário a divisão também era evidente. Alguns deputados estavam vestindo acessórios com as cores verde e amarelo e portavam placas escritas “Tchau querida”, se referindo a saída de Dilma da presidência. Alguns parlamentares contra o impeachment usavam bandeiras vermelhas nas costas e várias placas com os dizeres “Fora Cunha”. Às 20h30 a votação começou e cada deputado tinha 10 segundos para optar pelo sim, não ou pela abstenção.

Já nas primeiras declarações o clima de estádio de futebol se instaurou no local. A cada voto o time verde e amarelo entrava em alvoroço. O som do “sim” era escurecedor e sempre acompanhado por citações bíblicas, beijos e abraços para os familiares e discursos em defesa à família e à fé. “Senhor presidente quero deixar aqui o meu abraço a minha mulher Mariana. (...) Eu voto sim”, declara o Deputado Heráclito Fortes, do partido PSB.

O time vermelho, mesmo em minoria, tentava preencher o campo. Nos 10 segundos permitidos para fala de cada deputado eram defendidas a democracia e a legitimidade do governo de Dilma Rousseff. Mas o argumento principal era o questionamento sobre as diversas delações de conduta política corrupta direcionadas ao deputado do PMDB, Eduardo Cunha. “Eu vou esperar o conselho de ética mandar sua cassação para o plenário e quando isso acontecer eu vou votar sim, senhor presidente”, ameaça o deputado Glauber Braga, do Psol.

Próximo do fim das votações os deputados cantavam no plenário como no fim de uma partida já ganha. O decoro era impossível de se alcançar, a goleada já estava estabelecida. Com 341 votos “sim” e 127 votos “não”, era preciso mais um voto a favor para encerrar a reunião. E para a ironia ficar completa, este pênalti foi batido pelo deputado do PSDB, legenda de oposição ao partido da presidenta Dilma. Às 3h09 ao som de “Eu sou brasileiro, com muito orgulho e muito amor” a Câmara autorizou a abertura de processo de impeachment.

“Que Deus tenha misericórdia dessa nação. Eu voto sim.” - Eduardo Cunha, presidente da câmara dos deputados.

Foto: Gustavo Oliveira
Os filhos do sim

Rodrigo Yoshiba, empresário.

“Eu sou a favor por um motivo básico. Um presidente é como um gerente de uma loja. No caso nós, o povo, somos o dono. Se o gerente pisa na bola, me esconder informações, deixa os funcionários roubarem, vou demitir ele, certo? Senão minha loja vai falir. Não é muito diferente disso, é mais do que claro que ela não é uma boa gestora e errou muito. E deu margem dentro da lei para esse processo ir pra frente. O que causa discórdia é que os que estão tirando ela também são corruptos. Mas isso não anula as decisões erradas dela.

Eu trabalhei em formato PJ para diversas empresas por 3 anos. Tive que parar e aceitar um emprego para ganhar menos, pois alguns clientes meus fecharam e outros tiveram uma queda muito grande nos ganhos. Fora o monte de amigos meus que vi serem demitidos, preços subindo, etc. Eu vejo isso na realidade todo dia, não é uma mera disputa política, a coisa piorou claramente.”


Os filhos do não

Osmar Macedo - Jornalista

“Sou contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, pois nunca antes na história desse país pudemos conquistar tantos direitos. Sou natural de um município do norte do estado de Minas Gerais, uma das regiões mais desfavorecidas e pobres do país, além de sofrer com a seca que contribui significativamente para pobreza. Devido aos programas sociais, implementados pelos governos Lula e Dilma, pude, assim como muitos brasileiros, ingressar numa das melhores universidades públicas federais do país [UFMG], após graduar - me em História [em outra universidade pública também conceituada]. Mas a minha manutenção durante o curso superior, na capital do estado, foi possível devido aos programas de assistência estudantil do governo federal, como alimentação gratuita, auxílio médico e odontológico, auxílio transporte e incentivos para ingressar-me no mercado de trabalho. Apesar de vivermos um período crítico na economia e na política, não podemos abrir mão do que conquistamos até aqui.

Ressalto que mudanças são necessárias na maneira como a economia está sendo conduzida, mas de forma equilibrada, sem prejudicar os menos favorecidos, o estado democrático de direito e as liberdades individuais. Atualmente tenho condições de manter a minha vida e satisfazer as minhas necessidades com dignidade, pois as políticas de estado, implementadas pelo governo federal, contribuíram significativamente para isso.”

As siglas:
PCdoB – Partido do Socialismo Brasileiro
PMDB – Partido democrático brasileiro
PTB - Partido Trabalhista Brasiliero
PT- Partido dos Trabalhadores
PSB – Partido Socialista Brasileiro
Psol- Partido Socialismo e Liberdade
PSDB – Partido Social da Democracia Brasileira
UFMG- Universidade Federal de Minas Gerais
SBT – Sistema de Televisão Brasileiro

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